terça-feira, 15 de março de 2005

Sentimento como substrato

Vocês dizem. É cansativo estar com crianças. E não há dúvida que têm razão. Depois acrescentam: porque temos de nos pôr ao nível delas, porque temos de nos baixar inclinar, curvar, tornar pequenos. Mas aí vocês estão enganados. O que mais cansa não é isso, o que mais cansa é sermos obrigados a elevarmo-nos até à altura dos seus sentimentos. A esticarmo-nos, a alongarmo-nos, a ficar nos bicos de pés. Para não as magoar.
Janusz Korczack

As crianças e os adolescentes dizem-nos aquilo que precisam a cada momento/etapa da sua existência/desenvolvimento, ao adulto “basta” sair do seu pedestal e descodificar a sua linguagem, ao invés de ter uma atitude “não automática” em relação aos dogmas que a educação traz de longa data a esta parte. “Basta” não se prenderem “obsessivamente” aos esquemas rígidos de educação que receberam (tipo “chapa 10”), ou que, ainda, não se deixem subjugar por recalcamentos de educações rigorosas sofridas. Sei que é difícil falar de educação sem nos referirmos à nossa, mas é urgente que a maioria de nós o faça. Alguém escreveu que “quando as relações com os nossos filhos são demasiado difíceis, é provável que a nossa biografia tenha alguma responsabilidade nisso e nesse caso é útil consultar um psicoterapeuta”.
A Educação sem emoção, sem sentimento é oca do seu objecto principal, “Imundar a criança” como diz Delfim dos Santos, significa dar-lhe um mundo, ao adulto cabe a responsabilidade de lhe dar o melhor mundo possível, para tal, as emoções e os sentimentos devem estar na “proa desse barco”. Ensinar a reagir face aos conflitos, falhanços, lutos, separações, decepções, provações, sucessos, reencontros, êxitos, é uma obrigação a que o adulto não pode fugir, seja na escola, na família ou nos clubes.
Do nosso leitor mais assíduo: Miguel Sousa in Educar para a Saúde

16 comentários:

Caiê disse...

Gosto pouco de esquemas, de regras. A(s) vida(s) não são pré-definidas, portanto acho estranho os senhores das ciências educativas terem tanta instrução para nos ofertar... Cada criança não merecerá ser olhada por si, sem recurso prévio a Piaget e companhia (com a dévida vénia aos senhores, claro)?
Quanto à importância do sentimento, é incontornável. Sem ele, cresce um ser seco, pouco dado a afectos, cheio de problemáticas e medos vários, e com pouco jeitinho, ele próprio, para mostrar afeição.
Vivam os abraços e os momentos de colinho e de "saber ouvir"! ***

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Cara Caiê, não sei o que significa para si “os senhores das ciências educativas”, eu, como simples professor de ginástica, como adulto que vive as crianças (seja na escola, seja em casa como pai) opto por uma estratégia que proporcione o desenvolvimento de competências sociais ou específicas da disciplina que lecciono. O que vejo ao meu redor é uma tendência (neol-liberal) a influenciar os jovens para uma vida onde as palavras chaves, entre outras são o rendimento, a profissão e todas aquelas que podem trazer uma evolução económica para o futuro adulto, sem se preocupar com a arte de sentir, arte de se cultivar, arte de se relacionar. Resta –me dizer que não tenho nada contra que se estimulo os futuros adultos a serem economicamente bem sucedidos, o que me parece é que a questão dos valores está arredada, tornando a educação algo desequilibrada.

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A dona do blogue agradeço a oportunidade de participar numa tribuna tão respeitável. Obrigado cara Rosa...é uma honra que espero ser mereçedor

Caiê disse...

eh eh, não era uma crítica aos profes. Eu também sou profe. Bom, isso não significaria que não me criticasse a mim própria, o que poderia acontecer se achasse que tinha feito mal. Muhh.
Explico o que signica "srs das ciências educativas" - são os teóricos da educação que nos dão "n" teorias sobre como ser profes e, já agora, pais (isso por acaso ainda não sou) em vez de tentarem esforçar-se por entender os alunos/filhos, ajudá-los e cumprir a sua tarefa como todos nós.
Espero ter-me explicado. Acho tb que deixei claro que concordava com o post. E peço desculpa se feri a susceptibilidade de um colega. Au revoir.

Viuva Negra disse...

Ok
não concordo com O Chapa 10 , as crianças são simples e complexas , sinceras se assim for educadas e espontaneas, mas isto daria para muito e ja ando a escrever demais .
Os prof , tem si um papel importante na formação dos nossos filhos como individuos, mas a educação da-se em casa , na escola complementa-se. E necessario haver uma sinergia entre o triangulo , aluno , prof , pais , pois de outra maneira náo se sabe da missa a metade , os filhos deixamos de os conhecer no momento em que saem a porta de casa...

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Cara Colega Caiê, nem passou pela cabeça que me tivesse feito alguma crítica, ou à nossa classe, simplesmente senti necessidade de entender melhor a sua mensagem, e deixe-me que lhe diga que acho a teorização fundamental, mesmo que esteja bem longe da prática (cabe a nós, práticos utilizar e adaptar a teoria à prática). Quanto ao criticar a classe docente, acho muito bem que se faça, pois não podemos querer evoluir e depois tomar-mos a posição dos “intocáveis”. Cara Viúva, o interessante é que estamos todos em sintonia, gostava saber o que falha para que os resultados não sejam compatíveis. Concordo que a família deve ter um papel principal na educação dos filhos, claro está que há famílias que não têm condições para o fazerem e aí a Escola e a assistência social devem ter papel importante na sua reestruturação.

Caiê disse...

O que posso dizer é que a teoria para mim só é frutuosa se serve para ilustrar a prática. Caso contrário, é estéril. E com ideias estéreis, não avança a educação.
Claro que isto é uma opinião pessoalíssima. Poderá ser contestada. Eu sou boa a ouvir opiniões. Como já disse, gosto de estudar a vida. :)

RD disse...

Bom, como vou ser prof quando for grande, vou também dar a minha opiniãozita até porque disto não tenho conhecimento prático, só teórico e muito pouco.

Quem educa crianças tem que gostar delas e saber o que está a fazer, além disso tem que fazer como se diz no texto: saber elevar-se a elas, até porque isto não se aprende nas Ciências da Educação, que ao meu ver estão obsoletas.
Aprende-se por nós e pelo gosto que se tem, complementado pelas leituras de quem sabe, e pela experiência.

Quanto ao triângulo que deverá haver entre miúdos, pais e professores, pois eu diria que seria ideal, mas infelizmente não acontece na maioria, e acabam os professores, alguns com muito gosto, a dar conta do recado.
Farto-me de criticar as C.Educação porque são os que menos fazem o que ensinam. Não sei o que vai ser de mim tb, mas bem me apercebo o que irá ser de muitos colegas que só sabem beber matéria sem a pensar.

RD disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
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concordo consigo, por isso mesmo acho que os práticos têm obrigação de colocar a teoria em prática, utilizando não só uma na integra, mas conectado várias se possível. Tb estudo a vida e adoro fazer isso

RD disse...

Então já temos aqui 3 estudiosos da vida, hehe. Bom, todos o somos de certa forma.
Eu pessoalmente não tanto em matéria de pedagogias, sou mais virada para o conhecimento, antropologia filosófica e para a ética. É por isso que gosto de blogs, são como as universidades: diversidades numa unidade.

O que acham minhas bravas, de se ir convidando uma vez por outra, pessoas doutras áreas? Parece-me que o texto do Miguel foi importante para se reflectir.

*****

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Caríssima Gata Brava, de facto papou-me os comentários todos…mas parece-me que isso tem a ver com o facto de não ter ainda encontrado um elixir que torne o meu blogue em algo popular, de facto ninguém se interessa pela Educação para Saúde, ou seja é in dizer que nos preocupamos com a saúde, mas é uma chatice ler sobre o assunto.

Não sou tão céptico acerca das Ciências da Educação, acho que elas devem contribuir para o desenvolvimento do nosso sistema educativo. Alerto que desde o 25 de Abril tivemos um único Ministro da Educação com essa formação (Roberto Carneiro), todos os outros tinham tanta formação na área educativa, como todos os espectadores de futebol têm de metodologia do treino (ser professora universitária em economia, não é ter formação em educação).

RD disse...

Eu entendo-o porque Saúde é um tema de facto difícil, mas não se queixe que bem sei que o seu counter está bem alimentado.

As CE's devem contribuir sim, não temos dúvidas quanto a isso. O problema é que da forma como estão orientadas não vão longe. Desde o responsável, que é meu professor e que apregoa mundos e fundos muito bem e depois não pratica nada do que apregoa, até a outros professores que lá estão que nem pedagogia tem tb. Não imagina o rol de disparates que se ouvem. Ademais, e não pessoalizando, os conteúdos estão, repito, obsoletos. Completamente ultrapassados. Deveria haver uma nova interdisciplinariedade para estas ciências irem a outras buscar renovado conhecimento.
Digo-o eu que estou lá.
Se as coisas fossem mais sérias teríamos futuros melhores profissionais.

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Então o que tem contra a portuguesa palavra “contador” eh eh….isso nem parece vir de uma pessoa que dá tanto valor à palavra..se ainda viesse de mim que dou erros de português vá que não vá, mas de si, uma senhora com formação na área da filosofia. (foi só para pikar com alguma ternura, permita-me).


Quanto às Ciências da Educação, acredito que em algumas Universidades a coisa esteja pela hora da morte (tive em tempos num fórum com uma mestra da sua Universidade e a forma como expôs o tema, utilizando bibliografia com 20 anos de vida, quando a área que estava falando é das que mais publicações científicas produz foi …lamentável). Não sei o que se passa, por isso mesmo não gosto de falar. Mas se for à procura de pessoas como Manuel Ferreira Patrício, Proença de Garcia, Paulo Lopes, Carreiro da Costa e um conjunto de cientistas desta área da Universidade de Aveiro e da do Minho, encontrará gente que fala e …diz.

RD disse...

A sua arte do picanço está-se a desenvolver :) Mas é bem apontado. Tem toda a razão o Miguel, a partir de hoje não uso mais americanices, até porque não é um anglicismo, há realmente a palavra em português. ;)

Subscrevo o Ferreira Patrício. Diga-me Miguel, o Carreiro da Costa é o Francisco Carreiro da Costa? Se sim, já li esse senhor que me deu nome à rua, mas na área da Antropologia Cultural.

«« disse...

è sim, foi meu professor, trabalha para a FMH