terça-feira, 18 de outubro de 2005

Professores do quadro de honra

“Quando há dias me perguntaram quais as pessoas que mais influenciaram a minha vida, não pude deixar de pensar em duas professoras que, sem saber, me marcaram para sempre: Maria Vasconcelos e Natália Lemos.
Foram ambas professoras na Escola Primária Coronel Silva Leal, que nos anos 80 era um exemplo de bom ensino e referência obrigatória para qualquer candidato a professor na Escola do Magistério Primário da Horta. Mas os seus métodos de ensino eram tão diferentes quanto as suas personalidades, o que só engrandeceu os alunos que passaram pelas suas mãos.
A primeira, Maria Vasconcelos, foi quem me ensinou a escrever e me despertou para a leitura. Mas a verdade é que nos dois primeiros anos da escola primária me deu muito mais do que as bases do portugês e da matemática. O seu coração generoso deixou-me para a vida ensinamentos sem preço, que dificilmente poderiam caber nas linhas de um parágrafo, ou sequer de uma crónica.
Quando, no final do meu segundo ano, Mariazinha Vasconcelos (como carinhosamente ainda é conhecida no Faial) se reformou, a turma separou-se. Metade da classe trocou a Escola Primária Coronel Silva Leal pela nova primária da cidade e a outra metade, em que eu me incluía, passou para as mãos da professora Natália Lemos. Parecia o fim do paraíso, mas a nova professora depressa nos mostrou a outra dimensão da escola, onde o saber ultrapassava o programa escolar.
Em conjunto com o marido, Alberto Lemos – também ele professor naquela escola – provou-nos que a educação não se limita ao manual escolar. Aquele casal gastou o seu tempo e vida pessoal a preparar espectáculos, a escolher músicas e peças para ensinar aos seus alunos. Poucos terão passado pelas suas mãos sem aprender que estudar também é dançar o nosso folclore tradicional, recitar um poema ou representar uma cena de teatro. Tal como poucos terão saído das mãos de Mariazinha Vasconcelos sem saber que o esforço e a dedicação podem suplantar o talento mal aproveitado.
Professores como estes são raros hoje. Não porque não existam, mas porque lhes falta “tempo” e “espaço” para ensinarem as lições que não vêm no manual escolar. E que os alunos só aprenderão se quem os ensina se puder dedicar ao ensino de corpo e alma, em vez de andar preocupado com a ausência da família ou as duas rendas de casa para pagar no fim do mês.”

Lídia Bulcão, in Jornal dos Açores de 18-10-2005

9 comentários:

RD disse...

Tenho tantas saudades desses tempos!
Tenho um carinho especial pela Mariazinha Vasconcelos, sempre que a vejo aperto-a toda e falamos sempre de todas vós e de como estão! É uma querida :)
Sim, quem me dera que todos tivessem tido a nossa sorte!
Muitos beijos!

Vítor Leal Barros disse...

sem querer desconsiderar as duas senhoras tenho-vos a dizer que também eu tive professores que me encheram a vida dessa maneira... não foram muitos... mas tive. não sei se será a falta de tempo a causa do pequeno número de professores com essas características, sinceramente acho que professores assim existiram sempre poucos, neste e noutros tempos. penso que a raridade se manifesta não pela falta de tempo mas porque realmente não existem muitas pessoas assim. acho que é mais uma questão de pessoas, aquelas pessoas que mudaram realmente as nossas vidas. se não me engano a proporção deve ter sido sempre semelhante ao longo da história...como alguém disse...há pessoas e pessoas.

um beijo grande às duas...tenho saudades vossas.

Anónimo disse...

Gado Bravo. Ainda bem que deste estampa a este artigo. Subscrevo por inteiro, de pé, com ovação e vénia o descrito. Porquê? Porque também fui um dos sortudos que foram os alunos que passaram pelas mãos dos queridos professores Alberto e Natália Lemos, na Escola Primária do Salão (minha terra natal - agora resido nos Flamengos) Aliás este casal lá viveu (Salão) 19 anos! Chegando a dar aulas a fihos de alunos! Hoje que se fala em áreas escolas e projectos disto e daquilo, estas duas personalidades metem todos estes esquemas num canto. AInda há dias lhes perguntava se tinham tido problemas em modificar a aplicação do sistema, então em vigor, ao que Alberto Lemos me confirmou alguns desentendimentos com o então Director Escolar. . Foram mais que professores. Foram pais, amigos e pessoas que amaram a sua missão e lhes deram tudo.
Pena tenho, da minha sugestão da Escola do Salão se passar a designar de Prof. ALberto Lemos ter caído em saco roto. Estão Há espera para depois da sua morte?
Parabéns por este espaço também servir para recordar e homenagear pessoas que já deviam ter sido distinguidas pelo 10 de Junho!
Obrigado por este momento que me trouxe uma emoção e comoção enorme!

Caiê disse...

Como sempre tenho defendido, são os profes da escola primária que moldam a vida das pessoas, como o seu incentivo, inteligência e gosto pela vida... :)
Tive sorte, a minha também era excelente. Punha-nos a fazer teatro, a cantar e a estudar a sério, numa escola muito difícil, onde metade das pessoas não tinha que comer e roubava para isso.
Esses profes merecem muito.
Os profes que não têm espírito... enfim... cala-te boca!

RD disse...

Pois, meu irmão é que apanhou o casal Lemos a tempo inteiro na Coronel da Silva Leal, eu só apanhei 2 anos, como refere a Lídia.
Também gosto muito deles e partilho as vossas opiniões.
No meu entender, ser professor não é para todos, e sendo-o, exige muita dedicação por parte daqueles que não têm o "dom".
Tens razão Caiê, os professores da primária marcam-nos muito. Contudo, tenho algumas referências mais tarde, nomeadamente a Lisete Silveira, o Valente de Araújo e o Pedro (qq coisa) de Filosofia, com quem fiz teatro. Tudo grandes pessoas que passaram pela minha vida deixando marcas positivas.
Ah! E nunca esquecendo no colégio de Sto. António a querida irmã Adelina. Essa há-de ter o seu lugar no céu por me ter educado! :)

RD disse...

Lembras-te dela ElBravinha? Ainda hoje quando vai ao Faial, passa lá pela minha mãe a saber de nós! :)

mad cow disse...

Pois é, apesar de aguns anos depois, tb eu passei pelas mãos do professor Alberto Lemos, e pelo folclore da escola Coronel Silva Leal... No entanto, aproveito para reconhecer publicamente a enorme qualidade da pprofessora Luísa, que teve a paciência de aturar a minha classe durante os 4 anos da escola primária. Obrigado por tudo! Bjinhos*

Anónimo disse...

Só para agradecer a visita ao nosso blog.
Esperamos que continues a visistá-lo e, quanto à revista, é bom saber que, afinal, sempre há uma pessoa que lê a nossa crónica semanal.
Beijos,
Tunalhos.

RD disse...

:)